O sertão sempre foi difícil de
sobreviver e nos tempos passados, nas épocas do atraso e da falta de meios de
comunicação nem se fala, tudo era com muita dificuldade e se aproveitando
dessas adversidades é que surgiram os espertalhões e enganadores de um povo,
eles vinham com cara de santo, roupas de santo, perfume do bom, carros
importados, usando o nome de Deus em vão com uma conversa mole e mansa para
ludibriar e se passar por homem de bem.
Num passado desses, saiu das proximidades do
sítio Figueira divisa dos municípios de Manaíra e Santana de Mangueira aqui na
Paraíba, ainda pra dentro umas cinco léguas, um homem bem vestido, montado num
cavalo alazão de grande porte, com arreios de puro couro e bridões de metais niquelados
que brilhavam e reluziam por onde o cavaleiro passava, na montaria sobre a cela
tinha um capacho todo feito a mão com as inicias do nome do dono bordado com
ponto de máquina, era um luxo só, um homem rico que saiu de madrugada, ainda no
escuro para ir até a cidade de Princesa Isabel para vim chamar o Doutor
Severiano Diniz para fazer o parto de sua mulher que passou a noite inteira
botando força e gemendo com a dor de ganhar menino e nada do moleque sair.
Quando foi amanhecendo o dia, o sol
raiando por trás da Igreja Matriz de Princesa, (a Igreja Velha) o cavaleiro foi
chegando a frente ao consultório de Dr. Severiano que já estava a postos para
começar o atendimento aos seus pacientes. O homem chegou esbaforido, cavalgou a
madrugada toda para vim chamar o doutor e este ao receber o marido aflito por
ter deixado sua mulher quase nas últimas, não pestanejou, de prontidão falou
vamos embora. O cavaleiro trajava sua melhor roupa, abotoaduras no punho da
camisa e botão de ouro abotoando o colarinho, chapéu de massa da marca prado,
novo tirado da caixa, suas botas com bico de aço brilhavam e mostravam que o
homem tinha gado no curral, o cavalo não preciso mais relatar, estava impecável
os arreios do animal, o doutor não contou conversa, montou no seu animal que
logo cedo um empregado seu trazia para o muro de seu consultório e sem muita
conversa partiram em direção ao Sítio Figueira para ver se ainda dava tempo
salvar a mulher que naquelas alturas já estava quase sem forças.
A estrada era longa, de Princesa até
lá umas dez léguas, os animais acostumados a romper distâncias cortava o
tabuleiro quente que ao ser tocado pelos cascos saiam zunindo pelo acostamento.
Quando andaram umas duas horas o doutor indagou ao homem que até então viajava calado:
- Já estamos chegando?
O homem balançou com a
cabeça que sim. Mais adiante quando saíram da estrada principal e entraram numa
variante, galoparam por mais umas quatro léguas e quando o sol já chegava ao
meio do céu, indicando que já estava perto de meio dia, eles foram vendo ao
longe uma fumacinha saindo por entre uma mata que tinha na frente da casa.
Quando saíram de uma curva entraram no terreiro, o doutor deparou-se uma
casinha de taipa, buracos aberto por entre as varas que não tinha mais reboco,
calado o doutor Severiano foi entrando, a parteira que tinha prestado os
primeiros socorros foi quem o recebeu, levou até o quarto, o doutor viu logo
que tinha que fazer um parto fórceps, depois de muita luta tudo terminou bem, a
mulher e a criança o doutor conseguiu com ajuda de Deus salvar os dois. O homem
agradecido olhou pro doutor e disse com a voz quase faltando:
- Muito obrigado doutor
Severiano, o senhor salvou a minha companheira de sofrimento e o meu primeiro
filho!
Depois de tudo terminado bem, o
doutor já na varanda da casa, lavando as mãos e intrigado com o que estava
vendo, não se conteve e perguntou ao dono da casa:
- Agora me diga uma coisa,
como é que o senhor anda com um cavalo tão arrumado, um animal que vale muito
dinheiro e mora numas condições dessas? A casa quase caindo por cima de vocês,
uma mesa pra vocês almoçar não tem somente um banco feito de duas forquilhas é
toda mobília de vocês e você ainda anda com uns trajes desses?
O coitado do homem foi
sincero ao responder ao doutor:
- Tudo isso é emprestado,
doutor, eu sabia que se eu tivesse chegado com meus trajes maltrapilhos e
andando a pé, o senhor não tinha vindo salvar a vida de minha esposa!
Doutor Severiano calou-se e partiram no
caminho de volta a Princesa, o homem não tinha com que pagar os trabalhos
médicos naquele momento, mas os anos passaram e quando foi um belo dia, já
depois de uns dez anos chegou ao consultório de Dr. Severiano um homem puxando
um garoto e debaixo do braço um capão cevado que parecia mais um garrote, era o
pagamento de uma dívida de muitos anos atrás. O doutor nem lembrava mais, mas
ficou agradecido e ainda falou:
- Tem muita gente que
tenta enganar os outros para se dar bem e tirar proveito próprio, o seu caso
foi diferente, você me enganou por uma causa justa, por isso não guardo mágoas
de você. Que Deus te abençoe e toda a sua família. Mas tenha cuidado quando
algum homem bem vestido, com fala mansa e de carro importando chegar à sua
humilde casa, pode ter certeza que ele quer enganar você usando o santo nome de
Deus em vão e pregando o impossível. Pode desconfiar, quando a promessa for
grande demais.
Autor;
Rena Bezerra
03/01/2016
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